Recentemente, um tatuador viralizou nas redes sociais ao exibir uma frase inusitada no próprio corpo: “Não reanimar, doador de órgãos”. O gesto, que poderia parecer apenas provocativo, despertou uma onda de discussões sobre temas sérios e pouco debatidos no Brasil — entre eles, a autonomia do paciente, os limites da medicina de emergência e os entraves culturais que ainda cercam a doação de órgãos. Diante disso, cresce a pergunta: até onde vai o direito de decidir o próprio fim?
Tatuagem não substitui documento legal
Antes de tudo, é importante esclarecer: tatuagens não possuem valor jurídico. Embora a frase escrita no corpo do tatuador pareça clara, médicos não podem se basear nela para tomar decisões clínicas. Conforme determina o Conselho Federal de Medicina, apenas um documento chamado diretiva antecipada de vontade — também conhecido como testamento vital — garante legalmente o respeito à vontade do paciente. Assim, em casos de emergência, a prioridade das equipes médicas é preservar a vida, ainda que o corpo exiba mensagens em contrário.
A pele virou palco de um manifesto
Além do aspecto visual, a tatuagem carrega um forte simbolismo. Muitos usuários das redes sociais viram o ato como um grito de autonomia, um desejo legítimo de ser ouvido mesmo inconsciente. Outros, no entanto, criticaram a atitude, considerando-a confusa ou até perigosa. Apesar disso, especialistas apontam que expressar publicamente o desejo de doar órgãos ou de não ser reanimado pode servir como ponto de partida para discussões mais profundas — especialmente em um país onde falar sobre a morte ainda é tabu.
Brasil avança lentamente na cultura da doação
Ainda que o país registre avanços nos últimos anos, o caminho até uma cultura consolidada de doação de órgãos continua longo. De acordo com dados do Ministério da Saúde, o Brasil alcançou em 2023 a marca de 18,1 doadores efetivos por milhão de habitantes. No entanto, o número ainda está bem abaixo de países como a Espanha, que ultraa 46 doadores por milhão. Em grande parte dos casos, a recusa familiar impede a doação. Ou seja, mesmo que o indivíduo queira doar, é a família quem toma a decisão final. Logo, tatuagens como essa podem, no mínimo, provocar uma conversa urgente e necessária dentro de casa.
Perguntas frequentes
Não. A tatuagem não tem validade legal nem substitui documentos oficiais.
É preciso formalizar a decisão em cartório por meio de uma diretiva antecipada de vontade.
Mais de 40 mil brasileiros estão na fila de espera por um transplante.